Estratégia Saúde da Família completa 30 anos: profissionais do ICEPi contam suas experiências no ESF
A Estratégia Saúde da Família (ESF), principal política de Atenção Primária à Saúde (APS) do País, está completando 30 anos este ano e o Espírito Santo, que aderiu ao projeto do Governo Federal em 1998, tem muito a comemorar. Inicialmente, o Espírito Santo contava com apenas 26 equipes de Saúde da Família e 21 anos depois, em 2019, já eram 740. Atualmente, no Estado, são 1.058 equipes, um aumento correspondente a quase 40%.
Os números mostram resultados significativos: com o aumento das equipes, o Espírito Santo alcançou a marca de 108,43% de cobertura de Atenção Primária à Saúde, saindo da 5ª pior cobertura em 2019, para a 5ª melhor este ano, segundo informação do sistema federal eGestor.
Por isso, para marcar esta data tão importante e o fortalecimento da ESF no Estado, alcançado por meio de políticas e projetos desenvolvidos pela Secretaria da Saúde (Sesa), por meio da Subsecretaria de Atenção à Saúde e do Instituto Capixaba de Ensino, Pesquisa e Inovação em Saúde (ICEPi), profissionais em Saúde da Família, do Programa Estadual de Qualificação da Atenção Primária à Saúde (Qualifica-APS), contam como é o trabalho que realizam em seus respectivos territórios.
A coordenadora Estadual da Atenção Primária, da Sesa, Maria Angelica Callegario Vieira, ressalta que o Espírito Santo assumiu a ESF como principal modelo para a organização da Atenção Primária, tendo o Governo do Estado como grande incentivador e parceiro para a sua efetivação. “Em parceria com os municípios, estamos investindo cada vez mais em programas e políticas públicas, em busca da ampliação do acesso da população à Atenção Primária”, afirmou.
Ela destaca ainda que entre as várias iniciativas está o Plano Decenal APS+10, implementado por meio do Decreto 5.010-R, de 16 de novembro de 2021, que tem como objetivos qualificar e ampliar o acesso, e fortalecer e reorganizar a APS, por meio de parcerias e pactuações com os municípios capixabas. Além disso, ele traz as diretrizes, metas e estratégias de atuação governamental para o exercício de 2022 a 2032.
“Vale ressaltar o Qualifica-APS, que trabalha em busca da diminuição dos vazios assistenciais e da qualificação das práticas e serviços na Atenção Primária à Saúde, por meio de um processo seletivo público para médicos, enfermeiros, cirurgiões-dentistas, psicólogos, farmacêuticos, entre outras categorias, selecionados para formações de três a quatro anos. Além do Programa de Residência Médica e Multiprofissional em Saúde da Família e o componente de melhoria da infraestrutura física, com a construção e reforma de um total de mais de 100 Unidades Básicas de Saúde (UBS)”, reforçou Maria Angélica Callegario Vieira.
Desafio gratificante
Preceptora da Residência Multiprofissional de Saúde da Família e da Saúde Mental do ICEPi, a enfermeira Fernanda Silva Simon, com 20 anos de formação, atua há 17 anos na Estratégia Saúde da Família (ESF) ligada à Unidade Básica de Saúde de Jesus de Nazareth, em Vitória.
São várias ações trabalhadas dentro do território, como os atendimentos individuais e em grupos realizados por enfermeiros nas áreas de puericultura, saúde da mulher, do homem e o planejamento sexual reprodutivo. Além disso, a população tem acesso às mesmas atividades por meio dos profissionais que fazem parte da equipe multiprofissional da UBS e dos Residentes Multiprofissionais da Saúde da Família e da Saúde Mental do ICEPi, como psicólogos, assistentes sociais, educadores físicos, dentistas e Agentes Comunitários de Saúde (ACS).
“Trabalhar como enfermeira da Estratégia Saúde da Família é desafiador e gratificante. As complexidades são muitas, mas saber que estamos conseguindo impactar a vida dos pacientes de alguma forma, mesmo que parcialmente, é extremamente relevante. Na minha função, tenho o privilégio de não atuar somente na assistência, mas, principalmente, nas ações de prevenção e promoção de saúde, visando fortalecer as atividades que são essenciais para a melhoria da qualidade de vida da população no território”, explicou Fernanda Silva Simon.
Ela comenta que, além dos atendimentos individuais, em grupos e das visitas domiciliares, o trabalho envolve ainda os atendimentos compartilhados entre enfermeiros, as equipes multidisciplinares da UBS e os residentes do ICEPi, visando a estimular a troca de saberes e experiências profissionais e a desenvolver a clínica ampliada, centrada no sujeito e não na doença.
Outro braço deste trabalho em Jesus de Nazareth é a realização de estudos de caso de pacientes com as equipes. “O objetivo é estimular a discussão para a realização de um plano terapêutico que vise ao cuidado integral do usuário, levando em consideração os determinantes sociais do processo saúde e doença”, complementou a enfermeira.
Além disso, as equipes também realizam visitas e atendimentos domiciliares para conhecer as rotinas dos pacientes e assim fazer o acolhimento das demandas da saúde, por meio de uma escuta qualificada sobre as suas necessidades nos contextos físico, mental, social, entre outros. As ações incluem também reuniões de matriciamento da saúde mental com referências dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), de uma forma geral, e de matriciamento da saúde do idoso, especificamente, com matriciadores dos Centros de Referência de Atenção ao Idoso (Crai) em integração com a atenção primária, por meio de um modelo de trabalho colaborativo.
O trabalho também inclui rodas de educação permanente realizadas pelos Residentes de Saúde da Família e de Saúde Mental com outros profissionais da equipe; reuniões de Colegiado Gestor com representantes de todas as categorias profissionais da UBS; ações educativas em Sala de Espera; Grupo Hiperdia; Grupo de Apoio Terapêutico ao Tabagista; Grupo de Gestantes; Grupo de Ginástica; e atividades educativas de promoção da saúde nas Escolas Municipais de Ensino Fundamental (EMEFs) e nos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI).
Importância da amamentação
A médica de Saúde da Família do ICEPi, Isa Peixoto Franca Camargo, que atua na Unidade Básica de Saúde Centenário Penha, em Santa Teresa, explica que sempre gostou de realizar atendimentos de pré-natal e puericultura e que durante os seus 11 anos de atuação na Atenção Primária pôde acompanhar os desafios e as alegrias de diversas famílias nesse momento tão importante da chegada de um bebê. “Mesmo antes da maternidade, sempre tive uma grande paixão pelo tema da amamentação”, contou a médica.
Segundo ela, o Brasil ainda enfrenta desafios significativos nessa área, com taxas de aleitamento materno exclusivo abaixo do ideal. Dados do Ministério da Saúde indicam que apenas 45,7% dos bebês brasileiros são amamentados exclusivamente até os seis meses.
No mês de agosto, as ações foram voltadas ao “Agosto Dourado”, um período dedicado à promoção e ao incentivo do aleitamento materno, com a participação de gestantes e puérperas. Foram abordados temas, como as vantagens do aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida e como ele contribui para o desenvolvimento saudável da criança.
“Durante as atividades, também destacamos a importância do apoio familiar, especialmente dos companheiros, para o sucesso da amamentação. Foi gratificante ver muitos parceiros nas reuniões, demonstrando que o tema é de interesse e responsabilidade de toda a família, não apenas das mães”, ressaltou Isa Peixoto.
Para a médica, essas ações educativas reforçam o compromisso contínuo com a promoção da saúde materno-infantil. “Acredito que, por meio da educação e do apoio mútuo, podemos superar as barreiras culturais e práticas que ainda impedem muitas mães de amamentar seus filhos. Sigo motivada e apaixonada pelo tema, certa de que cada conversa, cada encontro e cada troca de experiências são passos importantes para um futuro em que todas as crianças tenham acesso ao melhor início de vida possível”, comemorou Isa Peixoto.
“Qualidade em ESF se faz com bons relacionamentos”, diz profissional
Pós-graduada em Medicina da Família e Comunidade, Paula Azevedo começou a trabalhar na Atenção Primária de Atílio Vivácqua em 2016. Pelo Provimento, a médica atua no município há quase cinco anos. Desde fevereiro de 2023, integra a equipe da Unidade de Saúde da Família (USF) do Centro da cidade. A profissional aponta que, ao longo desse tempo, tem tido a oportunidade de conciliar seus conhecimentos acadêmicos com o aprendizado obtido na ESF. “Os conhecimentos adquiridos são cumulativos. Enquanto a vida vai passando, novas experiências vão acontecendo e a tendência é o amadurecimento. O ICEPi foi e é fundamental na organização de todas essas informações acumuladas”, explicou.
Paula Azevedo ressalta também que participar do Qualifica-APS lhe possibilita contribuir com a otimização dos atendimentos ofertados pela ESF. A médica detalha que tem colaborado, por exemplo, na melhoria da assistência ao pré-natal; da saúde da criança, da mulher e do homem; do acompanhamento de doenças crônicas; e das atividades do grupo de tabagismo; além das reuniões de hipertensos e diabéticos na própria comunidade; da educação continuada com a equipe; da organização de demandas de receitas e de encaminhamentos a exames complementares e consultas de especialistas focais.
“Pude entender que um trabalho de qualidade em ESF se faz com bons relacionamentos com o paciente, com as famílias, com a comunidade, com a equipe, com o centro de especialidades, com as vigilâncias e com a gestão. Tudo isso só agrega e nos permite realizar uma medicina centrada na pessoa”, destacou Paula Azevedo.
Formação continuada
Formado em medicina em 1980, Roberto Gasparini Lima começou a carreira como médico do trabalho e atuou na especialidade por mais de 20 anos. Foi em 2002, quando iniciavam as primeiras especializações em Saúde da Família no Brasil, que ele decidiu cursar uma nova pós-graduação e mudar o rumo da vida profissional. “O Programa Saúde da Família, como era chamado, ainda estava engatinhando no Brasil e foi oferecida uma pós-graduação no Estado, com alguns profissionais vindos da Argentina. Mesmo sem conhecer muito, eu me identificava com o programa. Nesses anos de atuação profissional, trabalhei durante um tempo em uma comunidade no interior de Pedro Canário, carente e com diversas questões sociais. Isso me despertou a vontade de me especializar em Saúde da Família”, relembra o médico Roberto Gasparini Lima.
Em 2013, ele começou a atuar como médico de Saúde da Família em uma comunidade rural de Conceição da Barra, na Regional Norte de Saúde. Com a possibilidade de atuar por meio do programa do Governo Federal “Mais Médicos”, iniciou os atendimentos na unidade de ESF da Vila dos Pescadores em 2017 e permanece lá até os dias atuais. Nesse meio tempo, fez mais uma especialização em Saúde da Família pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e ingressou no Programa de Residência em Saúde da Família do ICEPi, em 2022.
“O ICEPi trouxe essa oportunidade de continuar estudando e expandir o olhar para temas comuns do dia a dia. O fato de interagir com profissionais de outros municípios e outras equipes de ESF faz com que a gente troque muita experiência. O meu território é de população em vulnerabilidade e discutimos dentro da residência qual a melhor forma de abordar as violências, o uso de drogas. Então temos muitas ações educativas e preventivas nas escolas e na comunidade”, disse Lima.
Nesse contexto, reforça a importância da fixação dos profissionais nos territórios para a garantia da assistência à saúde. “Já estou muito familiarizado com o território e a manutenção dos profissionais é positiva, porque conhecemos nossos pacientes. Quando tem muita rotatividade, isso não acontece”, explicou o médico.
Lima ressalta que são realizadas visitas domiciliares, acompanhamento de pacientes com doenças crônicas e degenerativas, pré-natal e demandas espontâneas. Além dos atendimentos de saúde, são promovidas ações de bate-papo com a comunidade. “A população gosta e responde de forma positiva, comparecendo para fazer os exames, por exemplo”, revela.
Oportunidade de trabalho no próprio território
A enfermeira e residente de Saúde da Família, Maihanny Rosa, natural do Rio Bananal, vê na formação do ICEPi a possibilidade de se qualificar sem sair do seu município de origem situado na Regional Central de Saúde. Desde 2022, ela atua na Unidade Básica de Saúde de São Jorge de Tiradentes, uma comunidade rural localizada a 20 minutos do Centro da cidade de Rio Bananal.
“A possibilidade de fazer residência na minha cidade foi excelente. A experiência é muito boa, aliando técnica e teoria. É uma ótima oportunidade para quem está iniciando a carreira e também para quem já está na profissão se atualizar. Apesar de a nossa rotina de trabalho ser intensa, principalmente porque atuamos com uma população em vulnerabilidade, gosto muito desse contato com as pessoas e é gratificante ver o resultado do nosso trabalho”, disse Maihanny Rosa.
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